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Friday, February 23, 2007

A infância e o trabalho: brincando de ser adulto.


A infância de acordo com os filósofos humanistas e racionalistas é vista com o preconceito de que ela é a imaturidade da razão. Esses pensadores mantinham a mesma concepção de infância, a de que a infância consiste na incapacidade de “julgar e bem discernir as coisas”. Humanistas e racionalistas, porém, concordam em dois pontos: que a infância é um momento ímpar onde são formados hábitos e as noções morais; concordam, também, que ao longo da infância é que os conhecimentos são assentados no intelecto. Se assim é, o trabalho durante a infância poderá prejudicar sua formação.


O trabalho infantil sempre foi muito utilizado. Na época da escravidão, equivocadamente, considerava-se que as crianças escravas, recrutadas ao trabalho desde cedo, aos 12 anos estavam devidamente preparadas para a lida. Com a abolição, meninos eram levados por fazendeiros para áreas rurais ou por artesãos para trabalhar em suas oficinas. As meninas eram destinadas aos afazeres domésticos, muitas vezes, sem qualquer remuneração.


O trabalho infantil sempre foi considerado como algo natural e as crianças, principalmente, as oriundas das classes menos abastadas, deveriam ajudar nos afazeres domésticos. Em conformidade com a concepção da época havia a expectativa da ajuda econômica por parte dos filhos e essa mentalidade perpetuou-se até os dias de hoje.


Muito embora a Constituição Federal Brasileira e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), proíbam o trabalho infantil no Brasil, 2,9 milhões de crianças e adolescentes trabalham (Ministério do Trabalho, 2005). No mundo existem em torno de 250 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 14 anos que trabalham, segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT).


Hoje, milhões de crianças brasileiras não têm a esperança de um futuro, nem traduzem a alegria do fato de serem crianças, porque são desrespeitadas como pessoas e despojadas de seus direitos por aqueles que deveriam garantir a sua segurança e o seu desenvolvimento sadio.


O Unicef (1997) estabelece que o trabalho infantil adquire características de exploração quando envolve: atividade em período integral, quando a criança ainda é muito jovem; muitas horas de atividade; atividade que provoque excessivo estresse físico, emocional ou psicológico; atividade e vida nas ruas em más condições; remuneração inadequada; responsabilidade excessiva; atividade que impeça o acesso à educação; atividade que comprometa a dignidade e a auto-estima da criança, como escravidão ou trabalho servil e exploração sexual; atividade prejudicial ao pleno desenvolvimento psicológico. (Silva, 2005)


Criança que trabalha sofre a violência de ver negados seus direitos e garantias e convivem com a conivência de grande parte da sociedade que entende o seu trabalho como inevitável e até desejável, em face da necessidade de suas famílias e da realidade de ficarem nas ruas desprotegidas. Essa situação caminha em descompasso com a proteção integral que lhe é devida, conforme à implementação dos direitos e garantias da criança, a quem é devida essa proteção, onde a mesma implica a permanência na escola e a profissionalização, para que esta tenha condições futuras no mercado da trabalho.


O trabalho precoce impede esse processo de desenvolvimento e preparação afastando a criança da escola, no mínimo, dificultando o seu aprendizado e prejudicando o seu desenvolvimento pleno como pessoa e cidadã, muitas vezes de forma irreversível, pelas repercussões negativas na saúde e desenvolvimento físico, moral e psíquico.


A partir das contribuições deixadas pelos filósofos humanistas e racionalistas, acredita-se com veemência “[...] que a educação da infância é uma questão fundamental para a emancipação do conhecimento” (Guido, 2002, p. 210), daí a grande importância da escola principalmente durante a infância.


Segundo Adorno (1995, p. 147) o processo de conscientização juntamente ao “processo de promoção da espontaneidade” deve ser desenvolvido desde a primeira educação infantil; desde a primeira infância, o que reforça a importância da educação.


A vivência plena da infância possibilita ao ser humano um desenvolvimento sem restrições, danos ou perdas, pois segundo Kohan “[...] sem infância não há história humana, nem experiência, nem linguagem, nem humanidade. Com infância a história humana, a linguagem e a humanidade tornam-se possíveis”. (2002, p. 235)

[...] a infância é devir; sem pacto, sem falta, sem fim, sem captura; ela é desequilíbrio; busca; novos territórios; nomadismo; encontro; multiplicidade em processo, diferença, experiência. Diferença não numérica; diferença em si mesma; diferença livre de pressupostos. Vida experimentada; expressão de vida; vida em movimento; vida em experiência (Kohan, 2003, p. 5)

Como educadores devemos nos despir de vez da visão de que a infância é a idade prematura; uma fase da vida do ser humano que se abandona quando se chega na vida adulta. Essa visão torna-se uma barreira para o desenvolvimento intelectual do homem. Se vermos na infância apenas ingenuidade nos atos práticos, esse homem acabará por perder a magia da descoberta.


A realidade da criança que trabalha exige uma reflexão de todos, uma vez que a criança é prioridade absoluta e tem direito a exigir de nós proteção integral, por ser uma pessoa em desenvolvimento, o que se traduz no direito à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar. Temos o dever de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração e violência. Tal ação é obrigação não só dos educadores, mas da família, do Estado, da sociedade como um todo; volto a repetir obrigação de todos nós.




Referências Bibliográficas
BRASIL. UNICEF. Estatuto da criança e do adolescente. Dispõe sobre o estatuto da criança e do adolescente e dá outras providências. Disponível em: www.unicef.org/brazil. Acesso em: fevereiro de 2006.

Silva, F. C. L.O trabalho infanto-juvenil na sociedade capitalista. Disponível em:<http://www.educaremrevista.ufpr.br/arquivos_15/lopes_da_silva.pdf>. Acesso em: 24 de dezembro de 2005.

BRASIL. MINISTÉRIO DO TRABALHO.
Trabalho infantil. Disponível em: www.mpt.gov.br/publicacoes/trab_inf.html. Acesso em: março de 2005.

GUIDO, H. A concepção filosófica de infância na modernidade: a contribuição humanista e racionalista. In: KOHAN, W. Ensino de Filosofia: perspectivas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

KOHAN, W. Uma educação da filosofia através da infância. In: KOHAN, W. Ensino de Filosofia: perspectivas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

ADORNO, T. W. Educação – Para quê? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.

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